Todo ano no final de agosto na pequena cidade de Wyoming, o banco central americano, Federal Reserve (Fed), organiza a conferência mais importante para se discutir política econômica e monetária, o “The Federal Reserve Bank of Kansas City’s Economic Policy Symposium” em Jackson Hole. Esse evento reúne economistas, acadêmicos, participantes do mercado financeiro, representantes do governo, representantes dos bancos centrais de vários países e a mídia para discutir políticas com impacto no médio e longo prazo. Historicamente, essa conferência tem iniciado grandes tendências ou alterado o cenário internacional, impactando principalmente os mercados dos países emergentes.
Em 2012 o atual presidente do Fed, Ben Bernanke, antecipou o anúncio de uma nova rodada de estímulos monetários, o “QE3”. Em 2014, foi a vez do presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, que antecipou novos estímulos. Todo ano existe uma expectativa de que algum tema relevante para a dinâmica dos mercados seja anunciada ou introduzido como tema para discussão futura. Como este ano estamos completando dez anos da crise de 2008, a conferência deve discutir sobre a transformação do mercado e suas implicações para a política monetária futura.
Existe uma ansiedade com o discurso do Jerome Powell, presidente do Fed, marcado para esta sexta-feira, se irá mencionar algo sobre os grandes temas que trouxeram aumento de volatilidade nos mercados, como a guerra comercial entre EUA e China, impacto do estímulo fiscal na economia americana e a redução do balanço do Fed que pode estar sendo responsável pela forte piora nos mercados emergentes. A forte alta do dólar no mundo contra as grandes economias e contra os emergentes este ano está sendo comparada a uma grande ressaca devido aos fortes estímulos monetários que foram introduzidos nos últimos anos e que agora começam a ser retirados.
O último relatório do Banco de Compensações Internacionais (BIS) mostrou que no primeiro trimestre deste ano a dívida em dólar das empresas dos países emergentes aumentou US$ 292 bilhões contra o primeiro trimestre de 2017 atingindo US$ 3,7 trilhões (o dobro de 2010). Somado a um total de US$ 7,8 trilhões de dívidas de empresas dos países desenvolvidos, chegamos a um passivo total de US$ 11,5 trilhões. Os maiores passivos nos emergentes estão em primeiro lugar na China, seguido do México, Turquia, Rússia e Brasil.
O forte aumento da volatilidade do dólar no mundo que, para muitos, é decorrente da redução do total de estímulo aplicado pelo Fed está resultando em uma diminuição da liquidez da moeda no mundo e está gerando uma demanda por hedges por parte das empresas. Junto com fluxo de repatriação de dólares para os EUA devido aos incentivos fiscais dados no início do ano e os fortes números da economia americana, principalmente no relativo às outras economias mundiais, têm criado um efeito bola de neve acentuando a demanda por dólares, prejudicando as economias emergentes.
Os benefícios da expansão do balanço do Fed nos últimos anos, que acabaram forçando um fluxo de capitais em busca por maiores retornos nos países emergentes, foram sentidos rapidamente nos últimos anos. É natural que a retirada desse estímulo tenha um efeito reverso, apesar de todo o benefício de um maior crescimento mundial que ajuda a manter os preços das commodities em um patamar elevado. A forte piora nos últimos três meses nos mercados emergentes mostrou a vulnerabilidade de alguns países, como a Argentina, Turquia, África do Sul e o Brasil. A piora nesses meses no mercado brasileiro foi muito atrelada à mudança de cenário no mercado internacional.
O investidor brasileiro está começando a mudar o foco para as eleições. A propaganda e inserções começam no final do mês e os 50% de indecisos podem alterar completamente as últimas pesquisas. O cenário internacional nos meses decisivos das eleições pode tornar o ambiente menos volátil ou colocar o Brasil como a próxima bola da vez, passando a liderar a piora dos emergentes, como fez no final de maio com a greve dos caminhoneiros.
O mundo, em especial os países emergentes, estarão atentos à conferência em Jackson Hole para ter alguma pista em relação à trajetória da redução do balanço dos bancos centrais e à alguma dica em relação à trajetória do juro nos EUA. Será a primeira conferência liderada pelo novo presidente do Fed em meio a uma grande confusão geopolítica no mundo e forte incerteza em relação à política monetária para o próximo ano.
*Luiz Eduardo Portella é sócio-gestor do Modal Asset Management
E-mail: lportella@modal.com.br